quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

EMBRAER CARGUEIRO MILITAR VOA EM 2014

Reportagem Especial do ESTADÃO de domingo, 24/11/2013
Roberto Godoy / TEXTO - Sérgio Castro / FOTOS - Gerson Mora e Anna Luiza Aragão / INFOGRAFIA
SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, SP


US$ 50 bilhões é o valor do mercado, até 2028, de 700 cargueiros militares de múltiplo emprego em 80 países, excluídos EUA, China e Rússia. O KC-390 foi incluído no PAC e está focado na ampla demanda internacional por esse tipo de aeronave.


O gigante está trancado em uma sala grande como ele mesmo, um prédio inteiro para acomodar com folga o corpo de 35 metros.
O modelo em escala real do novo jato da Embraer, o cargueiro militar KC-390, criado para cumprir várias missões, fica isolado na reservada unidade de Eugênio de Melo, a 20 km da sede da empresa em São José dos Campos. O jato em modelagem ainda está sem as asas – seriam necessários outros 35 metros.
Do mesmo local, há pouco menos de 40 anos, o Brasil influenciou guerras travadas no Oriente Médio e no norte da África, armou Exércitos latinos e equipou ex-colônias portuguesas.
Em certa época, o complexo de Eugênio de Melo abrigou a extinta ENGESA – de onde saíram os blindados batizados com nomes de serpentes brasileiras, Urutu e Cascavel.
O tempo é outro e a influência está regida pelo mercado. O KC-390 é uma iniciativa focada na ampla demanda internacional detectada pela Embraer – cerca de 700 aeronaves desse tipo serão negociadas em dez anos por US$ 50 bilhões.  “Acreditamos que poderemos entrar na disputa por alguma coisa como 15% desse total, na faixa de 105 unidades”, diz o presidente da Embraer Defesa e Segurança, Luiz Carlos Aguiar.


Incluído no ‘Programa de Aceleração do Crescimento’ – o PAC da presidente Dilma Rousseff –, o cargueiro e reabastecedor vai custar R$ 4,9 bilhões até a fase de construção dos 2 protótipos de desenvolvimento. A propriedade intelectual é da FAB. A etapa de encomendas pode chegar a mais R$ 3 bilhões – ao longo de 12 anos, estima o Ministério da Defesa. O programa já acumula 60 cartas de intenção de compra emitidas por seis diferentes governos: Brasil (28 jatos), Colômbia (12), Chile (6), Argentina (6), Portugal (6) e República Checa (2). “Penso que, mais uma vez, chegamos na hora certa em um segmento restrito, não atendido pelas ações tradicionais”, diz Aguiar.
De fato, o nicho está virtualmente vago. O principal concorrente é nobre: o poderoso Hércules C-130J, o mais recente arranjo da Lockheed-Martin, para o seu quadrimotor turboélice.
A primeira versão voou faz 60 anos. Até 2010, haviam sido entregues 2.500 deles para 70 clientes.


O KC-390 leva vantagem em quase tudo, a começar pelo fato de estar saindo agora das telas dos engenheiros de projeto. Mais que isso, transporta 23 toneladas contra os 20 mil quilos do C-130. Voará a 860 km/hora, mais alto, a 10,5 mil metros, e a um custo significativamente menor.
A concorrência de outras fontes é rarefeita e não se encaixa exatamente no mesmo viés, como é o caso do japonês Kawasaki C-2, em teste desde 2010, ou do europeu A-400M. Os dois são maiores e têm valor de aquisição elevado, de US$ 120 milhões a US$ 180 milhões. O modelo da Embraer fica na faixa pouco superior a US$ 80 milhões. E carrega tecnologia embarcada de última geração.
Os motores, por exemplo, permitem a operação nas pistas não pavimentadas e sem acabamento. As turbinas V-2500 da americana International Aero Enginesnão estão sujeitas à sucção de detritos.
Todo o projeto (veja o infográfico) utiliza conceitos avançados.



2014 - primeiro voo
2016 - primeira entrega



                                                                                                                                        O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 24 DE NOVEMBRO DE 2013                                                       Economia B11



O PESSOAL

Na Embraer, o grupo de profissionais que trabalha no desenvolvimento do cargueiro e avião-tanque para reabastecimento em voo, é conhecido como “o pessoal do KC”.
Jovens quasetodos, como o engenheiro Rodrigo Salgado, de 34 anos. Formado na escola de Itajubá, sul de Minas, trabalha na empresa há 11 anos. No programa, cuida da aviônica e da integração dos sistemas.
Considera a possibilidade de conviver com o produto ainda por muito tempo, decorrência “do desenvolvimento contínuo e da atualização das funções”.
De olho na impressionante cabine, repleta de telas digitais, terminais móveis e painéis de instrumentos que dão, ao módulo, ares de ônibus espacial, um piloto de ensaios da Força Aérea torcia para estar na equipe dos testes, previstos para o primeiro semestre de 2015. Combatente, “com mais de 2mil horas de voo” em supersônicos, e contemplado com um curso de especialização de custo estimado em US$ 1,2 milhão, o oficial avalia o advento do KC-390 na Aeronáutica “pelo valor estratégico: a aviação militar do País será capaz de se manter no ar, em quaisquer condições, com aeronaves de abastecimento, de ataque, transporte e inteligência, todas de projeto e fabricação próprios”.
O gigante da Embraer é parte de um acordo de cooperação entre a EDS e a Boeing. A composição abrange o compartilhamento de conhecimento tecnológico e avaliação conjunta de mercados.
É um bom modelo. A Boeing produz transportadores de carga e reabastecedores em voo há não menos de 45 anos. A Embraer é inovadora e imbatível em redução de custos. Conforme Luiz Aguiar, a análise dos mercados potenciais incluirá clientes que não haviam sido considerados nas projeções iniciais para o KC-390. É uma forma cuidadosa de dizer que os alvos passam a incluir países como a Itália e, talvez, mesmo os Estados Unidos.

ENTREVISTA
Paulo Gastão Silva, Diretor do Programa KC-390 NA WEB Online.
Confira o vídeo do cargueiro da Embraer
ILUSTRAÇÃO: MANÁ E.D.I/ABISSAL DESIGN

‘HÁ MERCADO EM TODA PARTE’


diretor do Programa KC-390 trabalha na Embraer há 13 anos – e desde 2005, depois de um longo período na área de inteligência de mercado, atua na definição dos conceitos que levaram ao maior avião produzido pela empresa.
Paulo Gastão é engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), turma de 1976.

● Como nasceu o programa KC-390?

No começo, aí por 2005, a ideia era outra, era a de usar partes do modelo civil 190, integradas a uma nova fuselagem com rampa traseira, e um ou outro ajuste. Era muito menor e mais leve. Ele foi revelado como C-390, apenas cargueiro, em 2007. Ao longo de 2008, a FAB, que já tinha entrado na história, revelou parâmetros do que seria o avião que serviria à Força.
Redefinimos do zero. Trabalhamos em um avião completamente novo. O contrato foi assinado em abril de 2009. Assim foi a gênese.

● Houve dificuldades, claro...

Ah, sim. Cada fase tem algo difícil. A primeira foi convencer as pessoas que vinham da outra ideia, a migrar para o novo avião. Depois tem o momento em que se diz “Será que vai dar certo? Nunca fizemos nada desse tamanho”... Foi a etapa do ganho de credibilidade.
Hoje, temos 1.500 pessoas trabalhando no KC-390.

● O avião sairá da fábrica de Gavião Peixoto, a 300 km de São Paulo. Que tamanho terá o hangar de produção?

O pavilhão maior, da montagem final, é imenso, tem 13 mil metros quadrados com pé direito de 22 metros, cerca de sete andares de altura. O vão livre para movimentar o avião tem de ter 18 metros.
Fica pronto nas próximas semanas. O módulo por onde passará o KC-390 é um hangar de 40 por 60 metros.

● Em relação ao mercado mundial, em que regiões o KC pode prosperar?

É um mercado muito espalhado, tem potencial em toda parte, não depende de poucos e grandes clientes. Nosso estudo de mercado endereçado indica demanda por 700 aeronaves em 80 países (menos Estados Unidos, Rússia e China) em 10, 15 anos. A gente quer disputar pelo menos 15% disso.

● Quais são os concorrentes do 390?

Há um projeto conjunto da Índia e da Rússia, mas em fase preliminar. Os chineses falam do Y-9, um turboélice. Ainda indefinido. O japonês Kawasaki está focado na necessidade interna. Tem quem pergunte sobre o A-400M, da Airbus. É uma outra classe de carga, alcance maior, preço bem maior. Sobra o C-130J. Não é pouco. A Embraer encara todo concorrente com muito respeito.

● Haverá uma versão de ataque ao solo como o Hércules Spectre/Stinger II, armados com canhões, mísseis, foguetes e bombas?

Não está no portfólio e depende de haver um cliente que eventualmente queira essa versão. Acho difícil.
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hoje 03:01

domingo, 8 de dezembro de 2013

Ditadura militar no Brasil matou cerca de 8 mil índios na construção das rodovias 174 e 163

Grande parte da população de Manaus nem era nascida na época da construção da BR-174 na primeira metade da década de 1970, e muitos não sabem desse evento, muito menos se lembram dos sinais daquilo que estava acontecendo a pouco mais de 100 km desta cidade. A rodovia estava sendo construída pelo Exército, e estava proibida a entrada de qualquer civil. O que a população de Manaus viu foi a o trânsito de tropas, inclusive com veículos blindados, subindo a estrada para a sua interação com um povo sem as mínimas condições de resistir um ataque com armas modernas.[2]
indios
Adendo 2017: - O jornalista Rubens Valente lançou recentemente o livro “Os Fuzis e as Flechas – Histórias de Sangue e Resistência Indígena na ditadura”, que narra as barbaridades cometidas contra os índios durante a ditadura militar. Os militares confrontaram povos indígenas para ocupar lugares como a Amazônia e impor obras como a construção da Rodovia Transamazônica.: “A história foi propositalmente esquecida. Se eu usar a palavra ‘abafada’, não estaria exagerando. Houve muito casos que não vinham ao conhecimento da opinião pública. Era uma estratégia dos militares de evitar que esse assunto transpirasse, principalmente porque tinham medo da reação internacional, já que a imprensa brasileira estava sob censura”[3].
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Por: Cesar Sanson | 25 Setembro 2013
Projetos de governos militares são investigados pela Comissão da Verdade. Maior parte das mortes, em quatro frentes de construção de rodovias, não foi registrada. Tais índios mna região, já haviam experimentado inúmeros choques com os civilizados. Em 1934, houve um massacre de silvícolas. Desde então, o branco não se atrevia a entrar no Rio, temendo represálias. Abaixo, tese de coronel canoeiro tentando explicar que os índios eram contra os brancos! é claro! os brancos que "civilizados", deveriam ter habilidade suficiente para lidar com os índios sem matá-los principalmente, com arma de fogo como fizeram.[1]
A reportagem é de Luciana Lima e publicada pelo portal Ig, 25-09-2013.
As investigações da Comissão Nacional da Verdade (CNV) pela região Amazônica indicam um verdadeiro genocídio de índios durante o período da ditadura militar. Não há como falar em um número exato de mortos devido à falta de registros. Os relatos colhidos, no entanto, apontam que cerca de oito mil índios foram exterminados em pelo menos quatro frentes de construção de estradas no meio da mata, projetos tocados com prioridade pelos governos militares na década de 1970.
Os trabalhos da Comissão da Verdade miram os processos de construção e o início do funcionamento das rodovias BR-230, conhecida como Transamazônica; a BR-174, que liga Manaus a Boa Vista, a BR-210, conhecida com Perimetral Norte e a BR 163, que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA).
Essas estradas fizeram parte do Plano Nacional de Integração (PIN), instituído pelo presidente Emílio Garrastazu Médici, em 16 de julho de 1970, e que previa que 100 quilômetros em cada lado das estradas a serem construídas deveriam ser destinados à colonização. A intenção do governo era assentar cerca de 500 mil pessoas em agrovilas que seriam fundadas.
Transamazônica
Transamazônica foi escolhida como prioridade e, por isso, representou uma verdadeira tragédia para 29 grupos indígenas, dentre eles, 11 etnias que viviam completamente isoladas. Documentos em poder da Comissão da Verdade apontam, por exemplo, o extermínio quase que total dos índios Jiahui e de boa parte dos Tenharim. O território dessas duas etnias está localizado no sul do Estado do Amazonas, no município de Humaitá.
O Ministério Público Federal no Amazonas também abriu um inquérito para apurar as violações de direitos humanos cometidas contra esses povos no período da ditadura militar. Os documentos indicam ainda que indígenas sobreviventes acabaram envolvidos nas obras em regime de escravidão.


Grupo Planejamento e Gestão do Território na Amazônia – UFAM
Mapa da Terra Indígena decretada por Figueiredo em 1981. Grupos indígenas foram os mais prejudicados pela política de ocupação da Amazônia no regime militar
Atualmente, a população Jiahui, de acordo com a Fundação Nacional do Índio (Funai), não chega a 90 índios. Antes da construção da estrada, eram mais de mil. Já os Tenharim somam hoje 700 pessoas. Eram mais de dois mil antes da chegada das frentes de construção.
Matança
Entre as práticas de violência contra índios já identificadas estão as “correrias”, expedições de matança de índios organizadas até o final da década de 1970, principalmente no sul do Amazonas e no Acre. Essa prática foi detalhada no primeiro relatório do Comitê Estadual da Verdade do Amazonas, um documento de 92 páginas, ao qual o iG teve acesso.
O relatório descreve a matança do povo Waimiri-Atroari, que habitava até 1967 a região entre Manaus e o município de Caracaraí, em Roraima. A região corresponde à parte norte do vale do rio Urubu e inclui os rios Uatumã, Curiuaú, Camanaú, Alalaú, todos no Amazonas, além dos rios Jauapery e Anauá, em todo Estado de Roraima, até a fronteira com a Guiana. Esse povo foi diretamente impactado pela construção da BR-174.
“Muitos dos episódios de 'correrias' tiveram a participação direta de agentes públicos”, aponta o relatório elaborado pelos coordenadores do comitê local, Egydio Schwade e Wilson Braga Reis.
“Pais, mães e filhos mortos, aldeias destruídas pelo fogo e por bombas. Gente resistindo e famílias correndo pelos varadouros à procura de refúgio em aldeia amiga. A floresta rasgada e os rios ocupados por gente agressiva e inimiga. Esta foi a geografia política e social vivenciada pelo povo Kiña desde o inicio da construção da BR-174 em 1967 até sua inauguração em 1977”, descreve no documento. O termo “Kiña” é uma outra denominação para os Waimiri-Atroari.
O relatório também informa que, entre os povos mais duramente atacados em “correrias”, estão os Kaxinawa e os Madiha no Acre, além do povo Juma, no sul do Amazonas.
Lista de mortos
O relatório também pede mais investigação sobre o desaparecimento dos índios Piriutiti e sobre o que ocorreu com outras etnias durante a execução das grandes obras do governo militar. “Documentos apontam também para o genocídio do grupo Piriutiti, na mesma região, que merece uma investigação mais específica”, diz o texto.
Para Schwade, a investigação da Comissão Nacional da Verdade sobre a violência sofrida por índios terá que apontar o que ocorreu com os Cinta Larga e Suruí, na região dos rios Aripuanã e Rooswelt, entre Rondônia e Mato Grosso; os Krenhakarore do rio Peixoto de Azevedo, na rodovia Cuiabá-Santarém (conhecidos como Índios Gigantes); os Kanê ou Beiços-de-Pau do Rio Arinos no Mato Grosso; os Avá-Canoeiro em Goiás; Parakanã e Arara no Pará, entre outros, em função dos projetos políticos e econômicos da Ditadura.


Grupo Planejamento e Gestão do Território na Amazônia – UFAM
Mapa dos limites da Terra Indígena decretada por Médici em julho de 1971 e área grilada em favor de empresários
Restrição de informação
De acordo com Schwade, apesar de o episódio ser relativamente recente e ter ocorrido bem próximo à capital amazonense, a cerca de 200 quilômetros, as pessoas sabem menos dessa matança do que sobre os massacres acontecidos aos mesmos índios há 150 anos. “Apesar da farta documentação existente, que comprova o exercício de uma política genocida, instalou-se junto ao povo Wamiri-Atroari um programa de controle da informação”, aponta. Os militares, de acordo Schwade, mantiveram afastados do local indigenistas, cientistas e jornalistas. “Não houve acesso, a não ser dos que tinham vinculação com os interesses empresariais instalados no território indígena”, denunciou.
O conluio de agentes públicos com empresários e fazendeiros ligados a lideranças políticas locais é outro ponto observado por técnicos da Comissão da Verdade que estiveram na Amazônia para colher informações. Onde as frentes para a abertura de estradas chegaram, também chegaram os fazendeiros, que se instalaram demarcando latifúndios em terras antes pertencentes aos índios.
Yanomamis
A construção da rodovia Perimetral Norte também é objeto de estudo da Comissão da Verdade. A obra representou um desastre para o povo Yanomami e estima-se que pelo menos dois mil índios dessa etnia tenham sido exterminados no período. Uma avaliação da Comissão da Verdade indica que o desastre só não foi maior porque o governo militar não chegou a concluir a obra. Com isso, muitas aldeias acabaram preservadas, já que o projeto da estrada, que cortava inteiramente o território Yanomami, não foi executado na integralidade.
O traçado planejado para a rodovia passava pelos Estados de Amazonas, Pará, Amapá e Roraima. A proposta era cortar toda a Amazônia brasileira, desde o Amapá até a fronteira colombiana no Estado do Amazonas. Até hoje, somente um trecho, em Roraima, com pouco mais de 400 quilômetros, e outro no Amapá, com cerca de 100 quilômetros, foram construídos.
Embora o trecho executado seja considerado relativamente pequeno, a construção foi capaz de exterminar, quase que por completo, os índios Yawarip, um subgrupo Yanomami, na década de 1970. Mais tarde, a publicidade dada no governo militar ao grande potencial mineral do território Yanomami desencadeou a instalação de garimpos ilegais nas terras dos índios, o que provocou mais destruição.
Prazo
A avaliação preliminar da Comissão da Verdade é de que os relatos sobre a violência indígenas são muitos, mas ainda pulverizados. De acordo com técnicos, o desafio da comissão para finalizar um texto capaz de promover consequências jurídicas está em estabelecer uma narrativa dos fatos. Diante desse desafio, os conselheiros da Comissão da Verdade estudam pedir novamente um prazo à presidente Dilma Rousseff para a apresentação do relatório final, pelo menos em relação ao tema indígena.
As três estradas estão sendo usadas como eixos da investigação, no entanto, os técnicos e conselheiros querem ainda contemplar no documento aspectos importantes como a militarização, na época, dos órgãos encarregados de proteger os índios. No caso, esse orgão seria a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Outro ponto importante do texto será o de estabelecer a cadeia de comando. Como os militares alegam que muitos documentos foram destruídos, fica quase impossível para comissão indicar de quem partiram as ordens para os ataques. A ideia é, nesse caso, que o texto indique quem ocupava cargos importantes na hierarquia militar em determinados Estados, municípios ou frentes de trabalho e que, pela rígida hierarquia militar, teria que ordenar ou consentir os ataques.
[1] Seria de obrigação do exército que o povo brasileiro paga seus estudos, sua formação militar, o guardião da floresta, o guardião das fronteiras, ter a diplomacia, sabedoria, conhecimento suficiente para lidar, convencer, os índios donos verdadeiros das terras tupiniquins,  à permitir que os brancos adentrassem no território, sem a matança cruel que fizeram: https://www.gentedeopiniao.com.br/colunista/hiram-reis-e-silva/os-waimiri-atroari-parte-iii-expedicao-padre-giovanni-calleri

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O estratégico nióbio


Adriano Benayon * - 11.11.2013

As chapas de ferro-nióbio são o principal dos produtos do nióbio nas exportações brasileiras, tendo totalizado US$ 4,8 bilhões, de 1996 a 2013. Somamos os dados, ano a ano, que estão na tabela do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.  
2.  O mercado é fechado, estando concentrado em poucas empresas importadoras e pouquíssimas empresas  exportadoras. São transações entre empresas dos mesmos grupos ou entre grupos associados. A CBMM, de Araxá, que exporta 90% do total, vende o produto às suas próprias subsidiárias no exterior.
3. O preço seria muito mais alto, se houvesse mercados abertos ou algum tipo de concorrência, a não ser entre indústrias utilizadoras do metal.
4. A Bolsa de Metais de Londres não informa sobre negociações com o nióbio. Muitas fontes dizem que o nióbio não é negociado nessa bolsa nem em outras. 
5. Encontrei na internet notícia recente, 6 de setembro,  da Bolsa de Metais de Bejing (Pekim) nestes termos: “Os preços do nióbio metálico a 99,9% de pureza permanecem estáveis em 115 a 120 dólares por quilo, na Comunidade de Estados Independentes.” [Rússia, Ucrânia e outros]
6. Guardei também uma cotação, de 22.01.2011, do sítio eletrônico “chemicool/elements/niobium”, de nióbio puro (óxido de nióbio), a US$ 18.00 por 100 g = US$ 180.00 por quilo. Além disso, outra, do mesmo ano, em que a barra de nióbio era cotada a US$ 315,70 por quilo.
7. Isso é mais de 10 vezes o preço oficial da exportação brasileira desse insumo, i.é., US$ 30,00 por quilo, no último ano.  Já o preço oficial da chapa de ferro-nióbio é menor ainda (R$ 25,00), mesmo porque não se refere propriamente ao nióbio incorporado  às chapas de ferro-nióbio, nas quais o conteúdo de nióbio é diminuto, embora suficiente para lhes dar qualidade muitíssimo acima das outras ligas metálicas.
8. Para ter uma ideia, o preço oficial das exportações das chapas de ferro-silício e ferro-manganês, têm estado em US$ 1,77 e US$ 2,25, respectivamente. Dez vezes inferiores aos do ferro-nióbio.
9. Embora o óxido de nióbio tenha muito valor no exterior, mormente transformado, após o processo de redução, ele é de pouca significação nas exportações oficiais brasileiras.  O valor oficial de suas vendas ao exterior quase dobrou de 2009 para 2010, mas não é expressivo: foi para US$ 44 milhões, com preço médio de US$ 30,00, para quase 1.500 toneladas.
10. Esse preço de um produto processado em pouco supera o do minério bruto, que vem associado ao tântalo e ao vanádio. As exportações oficiais desse minério chegaram, em 2012, a quase US$ 50 milhões, com valor unitário  de US$ 24,00.
11. Note-se que as mineradoras instaladas no Brasil, a CBMM e a Anglo-American, têm, com as chapas de ferro-nióbio, receita 36 vezes maior que a obtida com o minério bruto e 41 vezes maior que a obtida com  o óxido de nióbio, mesmo contando-se só suas provavelmente subfaturadas exportações.
12. Devem isso à iniciativa do professor Bautista Vidal, titular, nos anos 70, da Secretaria de Tecnologia Industrial. Ele mobilizou técnicos para criar o processo de incorporar o óxido às ligas metálicas, através do Departamento de Engenharia de Materiais - da Escola de Engenharia de Lorena- USP.
13. As exportações oficiais das chapas de ferro-nióbio certamente não chegam a US$ 6 bilhões, desde que começaram, nos anos 80,  até hoje. Pois, em 1996,  o volume ainda era diminuto, e os preços, muito baixos. De então até 2013, conforme a Tabela do MDIC, foram US$ 4,8 bilhões.
14. Causa, pois  surpresa esta notícia da Agência Bloomberg, dos EUA, publicada em 03/03/2013, no Valor Econômico: “Família mais rica do Brasil fez US$ 13 bilhões com o sonho do nióbio”.

15. Nela foi reportado: “Ela [a CBMM, Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração] vale pelo menos US$ 13 bilhões, baseado na venda da família de uma parte de 30% para um grupo de produtores de aço asiático por US$ 3,9 bilhões em 2011”.

16. O dado mais notável da notícia da Bloomberg/Valor Econômico é este: “ ... os herdeiros de Moreira Salles, a família mais rica do Brasil, seus quatro filhos, Fernando, Pedro, João e Walter, controlam uma fortuna combinada de US$ 27 bilhões, segundo o ‘Bloomberg Billionaires Index’ ”.

17. Levando em conta que o outro patrimônio mais importante do grupo Moreira Salles era o UNIBANCO, um banco que, há alguns anos, entrou em dificuldades e foi absorvido pelo Itaú,  parece nebuloso como foi possível acumular US$ 27 bilhões, com os lucros decorrentes fundamentalmente das exportações de nióbio, valoradas conforme as cifras oficiais.

18. De fato, os lucros disso para a CBMM não poderiam passar muito de US$ 1 bilhão, diante destes fatos: 1) faturamento de  $ 6 bilhões; 2) mesmo que os lucros tivessem sido sempre 50% do faturamento, não passariam de US$ 3 bilhões; 3) até 2007, a CBMM só tinha 50% das ações, além de que a tecnologia e o provável controle serem da Molybdenum Corp; dos EUA, do grupo Rockefeller; 4) desde 2011, há grupos siderúrgicos asiáticos com 30% de participação na CBMM; 5) a CODEMIG (estatal de Minas Gerais) tem 25% de participação nos “lucros operacionais” da CBMM; 6) 10% das exportações oficiais provêm da Anglo-American.
19. Com cerca de US$ 1 bilhão de lucros acumulados, e mais os  US$ 3,9 bilhões da venda de 30% do capital da CBMM, admitindo que tenham ido inteiramente para o grupo Moreira Salles, ainda se fica muito longe dos US$ 27 bilhões referidos na notícia mencionada.

20. Fica, pois, demonstrado que o Brasil está longe de ter, em seu proveito, as receitas reais ou, no mínimo, as receitas reais possíveis, da extração de seu subsolo de um metal tão precioso e estratégico como o nióbio.

21. A Constituição nasceu com deficiências, e até fraudes, como a que privilegia o serviço da dívida, e foi sendo emendada, quase que invariavelmente, para pior. E o que tem de bom, fica, nas atuais condições, sem serventia. Exemplo: a propriedade do subsolo e dos recursos minerais definidos como bens da União (art. 20, VIII, IX e X).

22. Seria a base para garantir o interesse do País nessa área. Entretanto, o Estado tornou-se demissionário: praticamente tudo é objeto de concessões. No caso da principal reserva de nióbio, a União a cedeu ao Estado de Minas. Este, depois de mais de trinta anos de concessão à CBMM, renovou-a, em 2003, por mais 30 anos, sem licitação.

23. Cabe indagar por que as coisas são assim? Creio que vêm de longe e se foram agravando. Aí pelos anos 50, alguns líderes ainda tentavam consolidar a consciência dos interesses nacionais, e o País fazia progressos para o desenvolvimento. Nisso, o País sofreu intervenções, como a conspiração que derrubou Vargas em 1954. Logo após esse golpe, foram dados privilégios às empresas transnacionais, cujos carteis foram esmagando, em crescente quantidade, promissoras indústrias nacionais.

24. Isso acentuou-se sob JK, com a mesma política de atração de capitais estrangeiros, a qual fez implantar o cartel da indústria automobilística. Esse, até hoje, produz déficits externos e ainda se ceva de isenções fiscais e subsídios da União, dos Estados e dos Municípios.

25. Ora, a desnacionalização  implica inviabilizar o desenvolvimento tecnológico e faz que o apoio governamental à ciência e a tecnologia seja,  na maior parte, desperdiçado, pois as tecnologias só se desenvolvem em empresas atuantes no mercado. E dele as nacionais têm hoje poucos nichos.  A consequência é a  desindustrialização, entendida não só como regressão à produção primária, mas também como confinamento da indústria a produções de baixo valor agregado.

26. Os capitais estrangeiros tornaram-se dominantes inclusive na informação, nas comunicações e na política. As políticas passaram a ser desenhadas no seu interesse. Entre os inumeráveis exemplos, está a lei Kandir, que isenta a exportação, inclusive de produtos primários, de IPI, ICMS e contribuições sociais. Primeiro lei complementar, ela ganhou mais status em 2003: através de EC, foi incorporada à Constituição.

27. Então, a sociedade fica sem forças para reagir, já que os empresários industriais nacionais foram dizimados, e os que restam são acuados por políticas adversas. Tampouco os trabalhadores estão bem organizados para defenderem o País, o que seria a própria defesa deles.
28. Tivesse o País evoluído nos últimos 59 anos, a economia ter-se-ia diversificado para patamares crescentes de intensidade tecnológica, e, como no quartzo para os chips e a eletrônica avançada, o  nióbio estaria sendo utilizado, em grande escala, nos bens de altíssimo valor agregado.
29. Nesse caso, não estaríamos falando das perdas atuais com subpreços. Nem precisaríamos lembrar que nosso percentual da oferta do nióbio  é muito maior que a de todos os membros da OPEP, juntos, no tocante ao petróleo. Poderíamos criar a Bolsa do Nióbio e defender seus preços.
30. E ganharíamos centenas de vezes mais ao fabricarmos bens de elevada tecnologia, competitivos, livres dos carteis e de grupos concentradores.
31. Esse padrão de desenvolvimento e de consciência dos interesses nacionais, por parte das lideranças políticas, faria  conhecer o real valor do nióbio e de outros recursos naturais, e, assim,  eles não seriam alienados por praticamente nada. O Brasil teria também ganhado poder suficiente para defender seu povo e seus bens.
[Notas: 1) a CBMM pertence à holding financeira, Brasil Warrants, originalmente Brazilian Warrants, adquirida em Londres, a qual seria controlada pela família Moreira Salles; 2) documentos oficiais classificam como de seu interesse estratégico dos EUA as reservas de nióbio situadas em Araxá (MG), concedidas à CMBB e Catalão (GO), à mineradora britânica Anglo-American.]

 *Adriano Benayon Consultor em finanças e em biomassa. Doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo, Bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Diplomado no Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, Itamaraty. Diplomata de carreira, postos na Holanda, Paraguai, Bulgária, Alemanha, Estados Unidos e México. Delegado do Brasil em reuniões multilaterais nas áreas econômica e tecnológica. 


Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na área de economia. Professor da Universidade de Brasília (Empresas Multinacionais; Sistema Financeiro Internacional; Estado e Desenvolvimento no Brasil). Autor de Globalização versus Desenvolvimento, 2ª ed. Editora Escrituras, São Paulo.